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A influência da TNE durante a perda de massa muscular e dismotilidade do TGI do paciente crítico.





Por: Camila Prim

Nutricionista, Especialista em Nutrição Parenteral e Enteral pela BRASPEN, Mestre em ciências da saúde, Especialista em Fisiologia Aplicada à Nutrição.


O trato gastrointestinal do doente crítico não descansa. Afinal, nesse momento clínico há um pano de fundo metabólico representado por diversas alterações hormonais. Dentre elas, percebe-se a elevada expressão de hormônios catabólicos (intensa proteólise) e citocinas inflamatórias, assim como também, a redução na liberação de hormônios gástricos, fato esse que contribui para alterações na contratilidade gástrica. Em adição, observa-se a prática comum de pilares terapêuticos como sedação, analgesia e bloqueadores musculares. Esses fatores associados ou isolados, contribuem para a perda na muscularidade, assim como também, para a presença das disfunções do trato gastrointestinal (TGI) na doença crítica1,2,3.

Estudos prévios ilustram que 62% dos pacientes críticos apresentam ao menos um episódio de disfunção do TGI 4 durante a permanência na unidade de terapia intensiva (UTI). Esse é um dado desafiador, afinal, na redução da tolerância digestiva, haverá dificuldade no alcance das metas nutricionais favorecendo, assim, à inadequação nutricional. Kim e colaboradores 5 evidenciam que 58% das dificuldades na entrega nutricional na UTI associam-se aos distúrbios do TGI.

Assim, observa-se que trazer a tolerabilidade do TGI ao centro do cuidado é fundamental. No entanto, na beira leito é, extremamente, desafiador avaliar a funcionalidade do TGI. Não há padronizado na literatura científica nenhum marcador bioquímico, que demonstre esse comprometimento. Porém, existem alguns sinais clínicos, que associados à condição do paciente “denunciam” possíveis intolerâncias do TGI. Dentre eles, a percepção do volume de resíduo gástrico (VRG), vômitos, náuseas, distensão abdominal e diarreia3. Recentemente, Reitam e colaboradores (2021) 6, sugestionam, escores de disfunção do TGI (GIDS), os quais são sumarizados na figura 1.




Além de perceber a disfunção do TGI, compreender os seus possíveis fatores etiológicos, é de extrema importância. Afinal, no compreendimento desses pontos, pode-se implementar estratégias que otimizam a terapêutica nutricional. Nesse sentido, um questionamento é cabível: A perda muscular inerente ao doente crítico, acomete, também, o TGI? Seria esse um dos fatores etiológicos para as disfunções na funcionalidade desse sistema?

Essa relação é percebida nos resultados de um estudo ex vivo realizado por Patejdl e colaboradores (2021) 7. Ao injetar soro de pacientes críticos, com elevada concentração de citocinas inflamatórias, os autores evidenciaram piora da contração e força da musculatura lisa do TGI. Diante dessas reflexões percebe-se que, na prática clínica, pensar apenas na meta calórica e proteica não é o suficiente. E, sim deve-se observar aspectos qualitativos da terapêutica nutricional que podem fazer a diferença.

Dentre as práticas terapêuticas que podem favorecer a reabilitação da musculatura lisa do TGI, destacam-se o início precoce da nutrição enteral, preferencialmente, com a escolha de formulações poliméricas8. Acredita-se que proteínas intactas corroboram para o maior estímulo da peristalse. Em adição, é importante destacar, a diferença na digestibilidade entre as qualidades proteicas. Estudos prévios demonstram melhor tolerabilidade e digestibilidade com blends proteicos diferenciados, não exclusivamente compostos por caseína9,10. Em adição, também, pode-se destacar o papel das fibras na reabilitação da motilidade do TGI. Arkwright et al 11 observaram, em modelo experimental, que a utilização da fibra na terapêutica nutricional contribuiu para maior potência e força na contração da musculara lisa.


Referências:


1. Preiser J-C. The stress response of critical illness: metabolic and hormonal aspects. Switzerland: Springer Cham; 2016. [cited 2019 July 11]. Available from: http://ezproxy.lib.monash.edu.au/login?url=http://link.springer.com/1 0.1007/978-3-319-27687-8;

2. Lambell, K.J., Tatucu-Babet, O.A., Chapple, La. et al. Nutrition therapy in critical illness: a review of the literature for clinicians. Crit Care 24, 35 (2020).

3. Govil D, Pal D. Gastrointestinal Motility Disorders in Critically Ill. Indian J Crit Care Med 2020;24(Suppl 4):S179–S182;

4. Reintam Blaser A, Malbrain ML, Starkopf J, Fruhwald S, Jakob SM, De Waele J, Braun JP, Poeze M, Spies C. Gastrointestinal function in intensive care patients: terminology, definitions and management. Recommendations of the ESICM Working Group on Abdominal Problems. Intensive Care Med. 2012 Mar;38(3):384-94. doi: 10.1007/s00134-011-2459-y.

5. Kim H, Stotts NA, Froelicher ES, Engler MM, Porter C. Why patients in critical care do not receive adequate enteral nutrition? A review of the literature. J Crit Care. 2012 Dec;27(6):702-13. doi: 10.1016/j.jcrc.2012.07.019. Epub 2012 Oct 17. PMID: 23084129.

6. Reintam Blaser A, Padar M, Mändul M, Elke G, Engel C, Fischer K, Giabicani M, Gold T, Hess B, Hiesmayr M, Jakob SM, Loudet CI, Meesters DM, Mongkolpun W, Paugam-Burtz C, Poeze M, Preiser JC, Renberg M, Rooijackers O, Tamme K, Wernerman J, Starkopf J. Development of the Gastrointestinal Dysfunction Score (GIDS) for critically ill patients - A prospective multicenter observational study (iSOFA study). Clin Nutr. 2021 Aug;40(8):4932-4940. doi: 10.1016/j.clnu.2021.07.015.

7. Patejdl R, Klawitter F, Walter U, Zanaty K, Schwandner F, Sellmann T, Porath K, Ehler J. A novel ex vivo model for critical illness neuromyopathy using freshly resected human colon smooth muscle. Scientific Reports. 2021; 11:24249.

8. Hogan S, Steffens D, Rangan A, Solomon M, Carey S The effect of diets delivered into the gastrointestinal tract on gutmotility after colorectal surgery—a systematic review and meta-analysis of randomised controlled trials. European Journal of Clinical Nutrition 2019.

9. Kuyumcu S, Menne D, Curcic J, et al. Noncoagulating Enteral Formula Can Empty Faster From the Stomach: A Double-Blind, Randomized Crossover Trial using Magnetic Resonance Imaging. JPEN Journal of parenteral and enteral nutrition 2015; 39(5): 544-51.

10. Goelen N, Janssen P, Ripken D, van Horssen P, Byloos K, Ghysels S, Putzeys G, Hofman Z, Vandecaveye V, Tack J. Effect of protein composition of enteral formula on gastric content volume during continuous feeding: A randomized controlled cross-over study in healthy adults. Clin Nutr. 2021 May;40(5):2663-2672.

11. J. W. Arkwright et al. Measurement of Muscular Activity Associated with Peristalsis in the Human Gut Using Fiber Bragg Grating Arrays. Sensors Journal. 2012, 12:113-117.


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